Cavando ideias – ‘Domingo no Aquário’

Cavando ideias – ‘Domingo no Aquário’

Cavando ideias – ‘Domingo no Aquário’ é resenha de Silvia Ferreira Lima em sua coluna semanal na Expedição CoMMúsica.

Domingo no Aquário de Joviniano Borges da Cunha
Domingo no Aquário de Joviniano Borges da Cunha Editora Árvore Digital, 2022.

Comprar o livro Domingo no Aquário, de Joviniano Borges da Cunha, foi uma surpresa e uma grande alegria. Afinal, eu e Jô, conforme era chamado, trabalhamos junto na Universidade Anhembi Morumbi, antes de se tornar uma universidade, quando existia apenas na Rua Casa do Ator, no Itaim, São Paulo. Entrei para dar aulas de Comunicação e Expressão em 1992. Na época, eu fiquei com três turmas de primeiro ano, uma vez que as disciplinas duravam um ano e não um semestre. Inclusive, considerando que no primeiro semestre, os alunos faziam um trabalho interdisciplinar com Comunicação e Expressão, Filosofia, Semiótica e Comunicação Visual. Fazíamos dupla docência nestas disciplinas (pois enquanto os alunos tinham mais duas aulas de Comunicação e Expressão tinham mais duas aulas de Comunicação Visual).

Eu ensinava Comunicação e Expressão e o Jô ensinava Comunicação Visual e História da Arte. Tivemos alguns alunos muito bons. E cada sala, com cerca de 70 alunos, fazia uma turma, que precisava escrever um texto teatral, montar cenário, figurino, sonoplastia e direção de um mesmo espetáculo. A este projeto chamávamos Mostra de Encenações. Eu e o Jô sempre trabalhávamos nas mesmas turmas. Acho que este projeto durou até 1996. Não lembro com certeza, mas creio que a partir daí, a duração das disciplinas, o nome das disciplinas e a organização dos cursos mudou bastante. Então, passamos a nos ver apenas nos corredores até que deixamos de nos ver.

Fomos muito bons colegas; afinal, o Jô era ótimo para fazer piadas e contar histórias de família. Eu apenas não tinha ideia de que as tais histórias já eram conhecidas para ele desde os fins da década de 70, conquistando dois prêmios literários: um em São Caetano do Sul e outro em São Bernardo do Campo. Conforme eu descobri, lendo seu livro. O próprio autor colocou no prefácio e na contracapa do livro, que se inspirou em Clarice Lispector, Nelson Rodrigues e Tenesse Williams. Bom, de Clarice Lispector existe a constância da personagem nordestina de A Hora da Estrela,  uma mulher pobre de espírito, ignorante e sem noção como a protagonista Macabéa. De Nelson Rodrigues, com certeza, há os dramas amorosos e escândalos domésticos; do mesmo modo que, Tenesse Williams, com Gata em Teto de Zinco Quente, (conforme traduzido no Brasil). Mas também identifico a ironia que beira à palhaçada de Comédias da Vida Privada de Luís Fernando Veríssimo. Esta mistura dá narrativas excelentes!

Aliás, parece que escuto a voz do Jô nos personagens de seus contos. Um deles, inclusive colocada de forma teatral, ou dramática, como As Formigas. Em geral, os contos são irônicos e tristes. A infelicidade oriunda dos personagens protagonistas é grande, do mesmo modo como a vida de Macabéa. Porém a fluidez de sua prosa, seu ritmo narrativo e a ironia, lembra-me demais o próprio Joviniano ironizando cenas de família, que acabava provocando risadas. E parece que sua família foi de fato um grande veio inspirador, conforme ele diz sobre a fotografia da capa.

Como leitores, nós abrimos o livro e só paramos quando as histórias terminam. Grande edição do Eduardo Dieb ou Edu, com quem eu também trabalhei embora não tivesse sido tão próxima. Do mesmo modo como trabalhei com o Carlinhos, amigo do Jô há décadas, que foi o revisor e ilustrador de um dos contos. Mas minhas parcerias de aulas foram com o Jô. E excelentes parcerias por sinal. Éramos parceiros quando minha filha(com cerca de um ano) apareceu com piolhos e eu tirei duas semanas de licença, para cuidar dela. Ele até lembrou ter pegado piolhos num projeto com garotos de seus cursos de teatro em escolas públicas. Pensando melhor, acho que já não éramos mais parceiros de disciplina nesta época, porque ela nasceu em 2001. Embora continuássemos nos encontrando nos corredores e prédios da Anhembi Morumbi.

Mas o Domingo no Aquário é um livro delicioso. Nós realmente rimos da desgraça alheia. E olha que não faltam desgraças. Acho que está no senso de humor do brasileiro, quando não há mais nada a fazer: ele dá risadas.

Achei contundente A mulher que matou a cadela, talvez porque eu ame meus cachorros. Mas o enredo deixa claro o desespero da protagonista, que é tomada por um extremo de agressividade e quem não tinha nenhuma culpa, ao contrário, só demonstrava medo e humildade, era a cadela. O conto que dá nome ao livro Domingo no Aquário também é bem interessante assim como As Formigas. Mas estes spoilers são apenas para sugerir o gostinho das histórias.

Jô, espero que você continue escrevendo. Você tem uma rapidez e facilidade de escrita e suas histórias sempre foram gostosas de ouvir. Bom, pelo menos, eu sempre achei. Sucesso com sua carreira de escritor. E o mesmo sucesso eu desejo ao Edu Dieb, afinal, ser editor também não é facil. Um grande beijo para vocês! E diversão certa aos leitores.

Quem tiver interesse em adquirir entrar no site: https://www.arvoredigitaleditora.com.br/

Referências:

Tenesse Williams : Gata em Teto de Zinco Quente; Um Bonde Chamado Desejo _ encontrado na Amazon.com

Clarice Lispector: A Hora da Estrela; A Paixão Segunda GH _ Também na Amazon.com

Nelson Rodrigues: Vestido de Noiva; A Mulher sem Pecado _

Luís Fernando Veríssimo: Comédias da Vida Privada

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